25 agosto 2010

Deixei lá atrás um pedaço de mim, um sonho presente que escrevi com as minhas mãos presas, envoltas em palavras que a ausência mal estranha.  Ficou guardado numa nascente tão viva, descrença momentanea, façanha estranha que nunca diria poder ser minha. Pedaço tecido de sentido que se erguia numa madrugada plena, musica que inventara sem saber dar nome aos acordes. Deixei uma lua nova, cheia do tanto que me molda sem reflexo nos caminhos claros desta estrada.
Por um instante, calei vozes roufenhas que falam tudo sem me falarem do fundo, que ribombam no trovejar de razão que nada empreende, fui mundana, fui morte nascida em fonte de agua fria que me deu vida. Renascida de mim na forma mais plena que me faz. Deixei-me assim la atrás.
Trouxe-me semente de voz, sede de crença, sabor de uma merenda saboreada demasiadas vezes, das mesmas letras, agua morna que a vivencia amolece. Sede colhida da minha vida, sede de ser mais vida que luz ténue que apaga a fé. Trouxe um pedaço de onda salgada que adormeceu na minha praia, espuma branca falada, num poema perdido no tempo. Trouxe o tempo que pára, que corre sem que o apanhe, que brinca nas esquinas de cada compasso e descaminho, de cada história calada que me esvazia.
Trouxe um dia, uma palavra inventada num sorriso que encerra uma história que viva, aguarda ser vivida, que morta não parte, que se mentira era verdade e se sorte. era sonhada. Trouxe uma rosa e uma pedra branca que colhi numa estrada.
Trouxe um brilho nos olhos que desponta de vez em quando, tela pintada da minha morada, palavras perdidas na madrugada de outrora. E eu pinto a minha cara, do sonho desperto que sempre que me encanta, aquece a minha cara molhada e agradeço o silencio de cada palavra que de mim disse tanto.

19 agosto 2010

Gosto de viajar de noite, de abrir as janelas do carro e sentir o fresco revolver-me o rosto, gosto da mescla de luzes e do mistério que os meus olhos adivinham. Gosto dos viajantes que se cruzam e do café mais saboroso a meio caminho. 
Parei um instante para esticar as pernas, um casal sentado nos bancos de piquenique, aqueles que se constroem para ninguém fazer uso, sem sombra nem sentido, saboreava vivencia, via-se no olhar que cada um oferecia, num entendimento mais sabio que qualquer conversa, imaginei que se beijavam na presença, se tocavam no sopro calmo dos anos passados unos, mais que o tempo lado a lado. Pensei que a felicidade, seria assim, que saboreassem um sentido que só eles conhecem, que se rissem daquele boné com a bandeira americana que acabara de passar, que ousassem o prazer do silencio. Sorri e sentei-me com eles. Rumavam a norte, procuravam fresco e um mar desocupado, brincavam com as mãos e as palavras, eram eles farol distante e claro, numa praia que os esperava.
Disse-lhes que era de Santarém sem nunca o ter sido, que ia para casa sem pressa, que tinha sede e ia comprar agua. Não precisava, eles tinham, e uma bolacha caseira que me soube a uma seara quente. Tinham um cão castiço que brincava na relva, marginal sem trela nem açaime. Contei-lhes do meu amigo e da tristeza que não passa, da ansia de me juntar a mim no pedaço que ficou em falta, calma, ele aparece que um amigo assim não se  perde nunca, que onde quer que estivesse tinha com ele tudo o que nos demos. Soltei uma lagrima por não saber como sentir senão chorando sempre que me lembro. Não era um cão, não, é mais que isso, companheiro meu, amigo, que não encontro o rasto.
Ficaria ali, gosto de falar com as faces que me parecem chamar, não são estranhas, não mais que as mascaras que se passeiam em cada dia sem deixarem pegada, são vozes achadas no fresco das noites, na calma de uma lua branca que espreita. Gosto das pessoas que me deixam um abraço quando partem, gosto das conversas francas por nada haver a provar ou manter, gosto de espreitar nas vidas coloridas e a seguir pinta-las com mais cores ainda. Gosto das histórias, das vidas.
Estava combinado, não nos veriamos de novo, mas naquele banco de pedra, ganhei uma migalha de vida que trouxe comigo.

18 agosto 2010

Não saberia crer na sorte, seria como ter nas minhas mãos pequenas, malabares coloridos que, lançando ao sopro fresco da vontade, caíssem toscamente na terra, mesmo que em seguida, os voltasse a lançar, com mais força, mais mestria. Seria um jogo doentio com a minha sede de ler o que a vivencia me ofertou, seria dizer-me que o breu de alma tem luz e a névoa se apaga, e eu, não leio as entrelinhas, não sei beber de fonte aleatória que não saciasse esta maré de entendimento, qual criança que juntasse peças que parecem não se conhecer.
Não poderia acreditar no destino, seria uma conversa cruel comigo mesma, um silencio imposto a cada sentido que ribomba no meu peito, seria como um fado sem rumo, uma voz muda a prender-me o sonho, mesmo que vestido de tantas ilusões e cores que nunca encontrei no caminho.
Não saberia falar acerca de justiça divina, há muito que os meus olhos passaram por terra batida de asco e podridão, que senti nas mãos a culpa de manjares fartos e caprichos obesos do vazio de não ver mais alem. Não saberia senão num sussurro, só por mim ouvido, cantar uma canção que falasse de tudo o que sinto, mesmo que colorido com os meus pinceis imaginados e as palavras que tantas vezes gritadas, me calaram, mais que disseram. 
Num instante, um momento pequenino, mais forte que o destino, mais verdade que a sorte, sinto, sinto o que não via e esperei ser mais que visto, sinto o silencio em sinos altaneiros que falam primeiro que qualquer medo, sinto tão forte, que as lagrimas correm na saudade e na esperança, na dadiva de uma vida que a sorte não me guardara e, o destino, esse senhor estranho que brincou comigo na inercia do gesto, na madrugada demasiado clara que hoje é viva em mim, mais que uma chama, mais que uma lagrima, é um sentido afinal que tardava.
Aprendi a presença que existe na distancia e a ausencia nas palavras, li a cartilha numa manhã cinzenta em que nada mais restava senão o meu reflexo enorme postado do outro lado, aprendi a força da verdade que o medo não esconde nem disfarça, percebi o que de genuino o caos me mostra e a mentira disfarçada de ordem.  Senti o alivio de uma bofetada por defender alto o que acredito, a leveza de não me querer mais sem mim, sem mandar à merda quem parecia enorme, não temo a morte por beber agora de uma fonte fresca a que chamo apenas agora. Agora...
Sempre me senti sozinha, desfasada, disfarçada, agradadora de uma história que nunca escrevi, num palco de vida que não me habita e porém, agora, agora, ergo as minhas mãos, não à sorte em que não creio, nem tão pouco ao destino, à vida que cresce em mim e me ensina e me chama, e me faz genuina, aprendiz de palavras que não conhecia, agora!

Sento-me na porta, cumprimento a saudade, em jeito de mensagem que a noite me solta, enrolo-me em mim, em vida, no fresco que a noite me oferta. Não saberia rezar ou crer na sorte, ergo as mãos à minha volta e canto baixinho uma canção nova que só agora pareço recordar.

04 agosto 2010

Noite quente, estranha, mistura da restea ardente que o calor parece possuir, um som distante de uma coruja altiva que me avista do telhado sobranceiro. Aguço o ouvido, crendo poder alcançar o sentido e a distancia.
Sentada no degrau da minha porta, abraço memórias vivas, respiro fundo e reconheço esta força que me ofereço nas horas mais minhas.

Saberia onde se canta e onde se fala, aceitaria as romarias e o fresco da lua misturada com as ondas, por ora sei mais de mim aqui perdida no meu encontro. Saberia onde se fantasia a vivencia, mas agora, deixo-me este bocadinho na minha neblina. Não estou sozinha assim à minha beira, não poderia.

03 agosto 2010

Penso tanto, deverei sentir como um humano sente, deverei respirar como um ser vivo respira, mas a minha mente rodopia em mim, em volta de um mundo onde espreito e tantas vezes não gosto, um turbilhão interior em me quedo, me descubro e me perco.
Obrigo-me, engolida em pensamento, escrevo sem alivio em cada palavra que de mim sai.  Nunca pertenci aqui, sempre soube disso, busquei sedenta, sentidos, nos caminhos desconhecidos que procurava, nas pessoas distantes que trouxe sempre comigo, não me via nas conversas, não me via nas ruas, nas gargalhadas, não me via nos degraus primeiros que cada um alcança. 
O meu amigo e eu, desbravamos uma estrada a que chamei lua cheia, rebolamos nas ervas altas, esquecidos das normas, fugiamos aos homens de cara roubada que gritavam posse e preconceito, convidei-o a entrar na minha alma, mas já antes nos encontraramos, num mundo desconhecido que poucos conhecem, tão poucos.
O meu amigo sentiu-me devastada por uma doença tão distante da honestidade emocional, que todos falam como se soubessem, encheu o meu coração de coragem, gestos que guardo em cada lagrima que me cai agora.
O meu amigo superou o conceito que pouco materializei de amizade, sinto-o neste momento em que a distancia só me impede de o abraçar or qualquer mão que não entendo, por um acaso sem sentido que me acompanha num rompante ridiculo a que alguns chamam destino.
Estou triste, de uma tristeza que não sei deter em mim, não é perda, porque não desisti, nem nunca seria capaz, não desisto, não sei aceitar se sinto tanto, procuro com todos os sentidos despertos, chamo, grito, aprendi a assobiar num instantinho, não sei esperar e afronto a sorte que nada me diz.
Calo a ignorância, calo as teorias idiotas do certo e errado, esqueço as mãos ausentes, que um sentimento me invade, um sentir tão genuino que não o encontrei nas caminhadas, faminta de carinho e desassossego, encontrei-o nos momentos unicos comigo e o meu amigo.
Sou maior do que me digo, não rezo, porque os deuses não me conhecem, nem lhes conheço o sentido, não entendo, nem quero fazer parte da multidão doente que se esqueceu de ser emocional, desta honestidade emprestada que se valoriza sem dizer nada. Ser honesto, é chorar e rir sem porquê, é tropeçar no silencio de uma estrada macia, farta de ser pisada sem pegadas deixadas, é dizer a medo que se tem medo porque o caminho de pedra nos cegou sem razão, é gritar sem voz a vontade insana que nos afoga, a dor de sermos sem expressão, a inexactidão, a nevoa.

Fazes-me falta meu amigo, tanto!