15 janeiro 2011

A maré revolta tem o mesmo cheiro, queria que visses a mensagem que as gaivotas parecem deixar num bailado preciso e misterioso, difícil de decifrar, como um canto antigo que fala do que as nossas mentes já não sabem ouvir. Os contornos que outrora aguardavam uma história que não soube contar, parecem agora mais sólidos e sisudos e os grãos de areia amparam passadas vazias que deixo marcadas enquanto caminho em direcção ao mar. Revejo-me e atordoo-me de mãos frias.
Queria chorar antes de te contar em palavras como tem sido, queria rasgar-me por inteiro e despir-me de pensamentos, olho o mar e sei que o sentido não é a direito, por isso invento o sul no horizonte poente e sento-me no mesmo lugar.
Também o  meu amigo já não está aqui, habita em mim em cada momento do meu dia, sinto-lhe o cheiro e a alegria, sinto o carinho. Uma chuva forte acaricia-me a face quente e vejo-te no prolongamento do meu olhar cego e desmedido. Mais forte que o alcance das minhas mãos, mais certo que cada gesto, são os traços que trago comigo, é este tempo já longo que passa e em que mal me reconheço, é uma clareira soalheira no meio do mar, claridade ofertada que ousei saber sublimar.
Lembro-me da minha boca ter mais vida que as barreiras da minha mente, dos gestos significados em silencio de um mesmo olhar, de nem saber acreditar por isso, que me era devido ser por inteiro sem ser preciso explicar.
Os meus sonhos estão comigo, guardo-os no meu bolso infinito e, calada sei adiar revê-los um por um. Mascarada de palavras, falta-me forma de as moldar, perdi-me na ansia de a encontrar, mesmo assim, converso contigo todos os dias, no meu jeito sem jeito de me decifrar.
Esta chuva forte que alaga os pedaços de terra que a memória me oferta, analogia do horizonte estendido em mim, foi mais forte que o que sempre julguei poder, foi rasgado da noite que não vi nascer, desperto em mim como a maior lição, e agora, as paginas viram-se na ventania sem que as ouse deter.
Meu Deus, a ironia da vida beijou-me um sonho, como se em silencio, gritasse o meu poder, apartada da minha parte que aqui revi, sei de cor, envergonhada, cada certeza, cada palavra que não me cobre nem tapa, que não me protege nem me mostra. Estou aqui sentada agora, na sombra desta escarpa, tão perto de mim.
Trouxe o sol mas ele brinca lá longe, o mar revolto parece assustar o meu amigo recolhido, que tal como eu, sente falta, chamei-lhe "Badalito" porque ele balança como o vento quando o mimo, dá saltos de lado na minha direção, não me parece que por agradecido de um capitulo enfim feliz. Encontrei-o abandonado, faminto, aprendeu o bem e o mal que o "raciocinio" nos faz, levou pancada certamente e respeito-o por isso.
Renasci-me de vida, deitei fora os adornos que não me diziam, sinto-me forte como esta rocha, capaz de tudo quando já nem cria, perdi a voz das lágrimas e sorrisos preditos, aspirei o caminho que sigo, sinto-me  madrugada hoje.
Guardo-te na maré mais forte, sorrio por te inventar crescente para lá deste horizonte e habitante de mim.

1 comentário:

marta marques disse...

tambem eu falo em silencio contigo.
ouves-me?