31 outubro 2009

Praia revolta




Despertei. O chegar embalado da noite, adormecera-me, encostada num rocha negra sombreira à maré meia, embalada em ondas, molhada. Sonhara com a tua chegada quente e ainda sentia nas minhas veias  a tua presença,  Noite clara de Lua cheia arqueada de espaço. Ouvem? É a voz do tempo que se espraia noutra praia, é o som dos velhos e dos nascidos, os que sabem de dentro, é a musica antiga que este mar conhece.
No cimo da serra fronteira, o vulto de ninguém.
Sabia que outro caminho se erguia, de pedras rasas, sem nuvem de pó, em silencio. Cheguei tarde ou cedo, cheguei à minha praia deserta, ergui a minha voz contra os elementos desordeiros. Já nada se vê no horizonte, os barcos partiram em frota ordeira e as gaivotas em debandada. Sabia que algures na serra tu vagueavas, admiravas vales fecundos, partilhado de romarias festeiras e mãos vazias de ofertas.
Ergui as minhas mãos, gritei do mais fundo da minha alma, uma  voz que calo há tanto tempo, um grito por cada pedaço  de mim, pela minha alma escondida que ninguém sabe ver, por este mundo sublime e sujo de gente.
Cansada, dei um passo, dois, ao longo da praia revolta de sabor a ti, percorri-a... E aguardei.

Horizonte



Era aquela altura em que a noite e o dia se cruzam e cumprimentam, um tempo envolto em movimento astral, aspirei o ar da lua recém nascida, passara outras  noites  ausente numa estrada perdida e empoeirada, parada muitas vezes em encruzilhadas, sem estrela do norte, enveredei por atalhos desabitados, conheci caras novas, presentes, outras que apenas guardo uma imagem esbatida. Aprendi a fazer o meu pão, a beber de um riacho raso, lavei-me de orvalho e fui deixando o peso da minha mala, em cada arvore que marcava o meu passado.
Envolvida num mundo novo, que sempre me acompanhara desde criança, a minha caminhada era tão só a despedida de vestes arcaicas de pensamentos e adornos elaborados, ricos de imagem falseada da minha alma distante.
Barrei o meu pão com a minha construção, bebi agua com casca de sobreiro em honra de todas as canções que conheço, esfreguei os pés com pedras pome e folhas verdes e enfeitei-me com uma flor do campo.
Cantei e chorei todo o caminho, de saudade do meu horizonte e dos meus contos tão cheios de vida e tão distantes, adormeci muitas vezes ao vento quente do entardecer, lembrada do meu crescimento em terras morenas de sabedoria. Fiz fogueiras de gravetos, espreitei nas encostas, ainda com medo, resvalei em pedras soltas, fiz da vontade a minha unica companhia. Não corria, sentia cada passo, atordoava-me o silencio por detrás das sombras.
Castelos assombrados pareciam erguer-se à passagem da minha vida. À sua volta dançavam moças bonitas, de braços soltos e passos leves, acenavam-me em jeito de coragem e eu agradecia.
Parei um dia, sentei-me à porta de um velhote de capote e cajado. Tinha os olhos raiados de um azul esverdeado, um sorriso desprendido e uma historia bonita que precisava de me contar por não ter tido tempo. O meu despertar havia sido o seu sono eterno. Falou-me da vida, do lugar a que pertencemos, falou-me de amor, tocou-me por dentro e deu-me um chouriço e uma pouca de azeitonas verdes já talhadas, De dentro, emanava o cheiro de bolo de amendoa, uma caricia, uma festa na cabeça e uma frase engraçada, para despedida. Disse-lhe que o levava comigo para sempre.
Ao longe ainda me virei uma ultima vez, dois vultos pequenos, de mãos dadas e um sorriso do tamanho do mundo.
Foi grande a minha estrada, cortada numa margem verde, onde se banhavam casais desalojados. Faziam amor com os sentidos; sentei-me na areia solta e molhada e admirei-os. Os corpos fundiam-se, dançavam e expressavam sorrisos, fecundos de verdade, soltos de pensamento, sentiam, por isso, quando me olharam, sabiam ver mais que aquela imagem parada. Perguntei-lhes o caminho depois do rio.
Num cais tosco de madeira, já gasta, um barco à vela. Olhei em volta na esperança de o ver ainda, imaginei a espera de um velejador de sonhos sabedor da semente semeada na minha essência, havia de saber sempre que chegaria. Agradeci ao meu pai e soltei as amarras, hasteei uma vela e rumei ao meu porto. Pássaros migrantes furavam a nevoa solta, curiosos, recordações de passagens da minha vida, viagens, conquistas e histórias cheias de mim.
Cheguei antes de o sol se pôr. De mansinho, deixei solto o meu barco, senti os meus pés descalços numa areia branca e grossa, na curva da terra, desaguavamos, eu e o rio, num mar azul de fundo, imenso, ventoso e expectante.
A flor que trazia no meu cabelo, soltara-se em petalas de cor, as gaivotas loucas chegavam de uma pescaria farta, os  barcos balançavam ao som do vento, aspirei um cheiro eterno que de mim emana, fruto de um sentir de luas e prazeres. Vesti um vestido laranja, honrada pela beleza da dádiva da terra alentejana que me concebeu, reconfortada de palavras serenas e cheias de amor.
As  minhas mãos soltas tremiam, inspirei ao mais fundo de mim, enterrei os meus pés na areia fria e aguardei em silencio. De repente, cada elemento parava, aspirava ritmado, só a luz de um farol distante, esboçava um quadro de movimento.
Tudo o resto esperava comigo.



Senti as tuas mãos grandes percorrerem cada fio do meu cabelo, a tua respiração, senti o teu peito suado no meu, sem uma palavra, as minhas mãos bebiam cada pedaço de ti. As nossas caras salgadas, a estrada sentida, o teu olhar no meu.
Não era um abraço que pedia, era a minha vida inteira, chegada.


Bom fim de semana para mim



Obrigada gente anónima, escondida, que não faz nada, nem uma porcaria de uma notificação em tempo legal.
EN3 Km 75.5. Onde é isto? Onde é que se esconderam estas bestas para me apanharem a 70 Km/h?
O dia tem 24 horas, sei que ando apressada, sei que preciso de chegar depressa, mesmo onde não se vê nada, sei a vontade de esganar os crescentes deambulantes que se arrastam, e as familiazinhas de fim de semana, sem horas, sei que exerço o meu direito de infringir. Estou sóbria e consciente... Mas 70 Km/hora?

Prémio acrescido: Um mês sem conduzir!!!

Ao menos que me apanhassem, me mandassem parar, com aquele ar de autoridade implicita, me fizessem soprar no aparelhómetro e me obrigassem a esvaziar logo ali a carteira, ou não.
Não os vejo na rua, quando ontem vi uma menina a ser espancada pela mãe, não os vejo nas esquinas escuras por onde passo, não se mostram nos conflitos, não se aprontam, estão escondidos.
Conheço as expressões, a formação, o orgulho mascarado.

Nem as fardas excitam!
Bom fim de semana para mim e para quem mais quiser.

Viva !

Obrigada Luz. Nesta quase madrugada, tens sido companhia iluminada.


Resta-me responder, então:

1- Escrever uma lista com 8 caracteristicas
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2- Convidar 8 bloggers para receber o selo
Há alguns que sigo, que me revejo, remeto-lhes este selo, com um laço e um abraço.

. À minha irmã  , que me acompanha na vida
. À minha amiga linda
. A um poeta e companheiro de desassossegos
. A um profeta iluminado
. A uma luzinha que me ilumina
. A um convicto de expressão
. A uma voz quase gémea, quem havia de ser?
. E a mais alguém

3- Comentar no blog de quem lhe deu o selo
Já está


4- Comentar no blog de quem escolheu.
A seguir...


Bom fim de semana, cheio da luz que te faz assim.


Lembras-te mesmo de mim? Quando me vês, numa mão, memórias que sinto mais que uma vida, mais que ilusão, na outra, um olhar inconsciente, silencioso e quase descrente.
Não se esquece com a cabeça, o coração. (plagio),..
Não me enquadro na normalidade de um sorriso, não consigo, não me entendo no cumprimento, não sei onde param as minhas mãos, aquela imagem não me conhece.
Eu vejo-te, vejo-te de fora do meu corpo, vejo-te na imagem que não me ofereceste por ser verdadeira. Tremo por um gesto simples num balcão qualquer.
E tu não me vês, nem mesmo quando me olhas.
Tremo por dentro.
Reconheces a minha voz embargada? O meu sorriso pensado e os meus pés que se movem calçados? Teatro. O meu sentir não se faz de madrugadas partilhadas, faz-se maior, faz-se estrada, descontinuada, faz-me inimiga e falsa, faz-me amar-te sem alimento, mais... Faz-me ter medo, faz-me não crer.
Da hora, trago um olhar, mais que um mar ou uma historia contada.
E tu não me vês, mesmo quando me olhas.
Questiono-me se sabes, de tanto que julgas entender, questiono-me se a tua raiva não é o que calas para eu não saber, questiono-me se estás ou és só imagem, de uma verdade que eu soube antes. Não sou o continuar, não prevaleço na crença, sou eu própria ignorância neste tempo sem arte, de um gesto sentido que mal reconheço.
És mestre em moldar palavras e desconcertos, cego dos gestos, arremessados e finitos.
E tu sabes tão mais de mim...

30 outubro 2009

Minha amiga mais querida.

Eu falo contigo, mas sabes, é aqui que me deixo. Pronuncia tão serena para quem sente tanto, eu vejo-te agora sozinha, despida de imagens a que o teu dia obriga, de palavras amargas e um trago de abraço, por um dia cheio de nada que nos tarda.
Estou contigo, Marta, minha amiga mais querida, de voz singela e dedos de prata!
Estarei sempre, do mais fundo de mim, em cada passo tresloucado que dermos, em cada esfolar de joelhos, em tudo e em nada.
Estranho... 
Hoje descobri-te numa ideia alcançada?


Duas imagens num quadro
Duas noites diferentes
Sentido e presente
Sonhado e findo.


Vivo.
Que se ergam os elementos
dançantes num poema
tela imaginada
terrena e tão calma...

Limites


Faço-me acompanhar de uma dor de cabeça que não passa, por isso, sabedora do porquê, abraço-me de livros e exercicios que me ultrapassam. Almoço com eles, não os largo.
No meu mundo, existem limites e continuidades. Ficam de fora as igualdades que me envolvem, descomprometidas de equação.
Hoje esgotei-me na apreensão de formulas. Engraçadas. Encontrei mnemónicas para as decorar, feitas das minhas imagens.
Um, dividido por infinito, tende para nada. Mas se se eleva, é ele próprio infinito. As indeterminações surgem na vida das divisões e multiplicações do que não finda,  ou se nada se divide, por nada. Assim, basta ver-me num quadro negro para não me esquecer.
Outra vertente são os limites. Qualquer variavel polinomial que tenda para nada, tem um dominio finito.
Mas, sendo crescente, o limite é o céu!
Basta lembrar-me, basta sentar-me e olhar para mim e tenho na minha mente, o que não consigo esquecer.

Não ser





Ah! arrancar às carnes laceradas
Seu mísero segredo de consciência!
Ah! poder ser apenas florescência
De astros em puras noites deslumbradas!

Ser nostálgico choupo ao entardecer,
De ramos graves, plácidos, absortos
Na mágica tarefa de viver!

Quem nos deu asas para andar de rastos?
Quem nos deu olhos para ver os astros
Sem nos dar braços para os alcançar?!...

Noite baça.

Noites mal dormidas. Sou persistente o suficiente, por isso não desisto.
A minha aula está meia, não se nota a diferenca na amalgama de caras análogas. É recorrente sentir-me estranha.
Cheguei atrasada, vinha da serra que cada vez mais me acolhe, em conversa simples e amena.
Deixo o tempo passar, ninguém me espera no fim da descida. O meu sitio hoje estava cheio. Preenchido por um casal igual a outro qualquer. Vidros embaciados de exclamares e prazeres que respeito, sinto este tempo mágico se sentido, mais que propagado sob a forma de exercicio. Na minha mente, dançaram imagens de lembranças misturadas com vontade. O ultimo degrau do desejo no limiar da loucura.

Cheguei tarde, dizia, o portão de ferro semi fechado, uns oculos como cartão de visita de uma certa e profunda falta de vida, anunciavam que o parque estava cheio. Aquele homenzinho leva demasiadamente a sério o posto que ocupa. Intransigente, restou-me recuar de olhos postos numa ruazinha que não sei onde vai dar, mas que oferecia, logo ali um lugar. Enquanto os meus vidros embaciados de desprazer não me deixavam ver, repetia 5 teoremas que passei o dia a decorar. O resto, não sei. O passo seguinte foi um barulho e a gravidade tornar-se obliqua. Sai da carrinha, Tinha uma roda à altura do meu joelho e a inversa, enfiada numa fossa aberta. Nunca a vira.
Acercaram-se de imediato aquelas sapiencias de estrada habituais, sem se mexerem, davam opinioes acerca do caso bicudo que tinha em mãos, a maioria assinalava a impossibilidade de tirar dali o carro sem  uma grua.   Sem sangue na cara, a minha mente a mil, rebuscada de vivencias muito minhas, só pensava em soluções, o carro tinha que sair dali. Como eu detesto derrotismos nestas alturas..
Pensei no pneu que tinha de sobra, avistei umas tantas pedras e tabuas e equacionei a solução, encher o espaço que tirava tracção ao carro.
O som de fundo ajustava-se na perfeição à imagem que tenho dos escalabitanos de gema.  Muito barulho e pouca acção. Enchi-me de lama, consegui fazer um monte de entulho com a ajuda de um rapaz de rabo de fora com esta mania de calças descaidas. Não era de cá.
Conseguimos, tem umas mossas, não deita óleo, trabalha, não acendeu aquelas luzes vermelhas.
Cheguei a meio da aula. Suja, farta disto tudo, farta de contar comigo, depositei naquele buraco a minha raiva toda, deste mundo que me apetece deitar fora. Adicionei ao meu livrinho de desenrasques solitários e segui em frente.



Tenho um professor que surpreendemente me disse que tenho um ar selvagem. Ri-me por dentro de tamanha falsa impressão. Não sou estranha nem me entranho num rebanho de que não faço parte, mas às vezes ultrapassa-me esta rebeldia dos meus dias. Centenas de kms sozinha, cargas explosivas que me acompanham, horas de conversas comigo e a sensação de já não saber fazer de outra forma. Podia ter chamado a assistência enquanto fumava um cigarro.

E calada, falsa, não digo o tanto que me assusta e o medo que vive cá dentro, partilhado comigo.

29 outubro 2009

Alegoria da Caverna



Os  nossos sentidos, segundo Sócrates, mantêm uma relação direta com o que sentem. 
Não é esse, porém, o caso da visão. Para que a visão se realize, não bastam os olhos  e as coisas coloridas , mas é preciso um terceiro elemento que permita aos olhos ver e às coisas serem vistas: para que haja um visível visto é preciso a luz. 
A luz não é o olho nem a cor, mas o que faz com que o olho veja a cor e que a cor seja vista pelo olho. 
É graças ao Sol que há um mundo visível. Por que as coisas podem ser vistas? Porque a cor é filha da luz. 


Por que os olhos são capazes de ver? Porque são filhos do Sol: são faróis ou luzes que iluminam as coisas para que se tornem visíveis. 
A visão é, assim, uma atividade e uma passividade dos olhos. Atividade, porque é a luz do olhar que torna as coisas visíveis. Passividade, porque os olhos recebem sua luz do Sol.

Conhecer a verdade é ver com os olhos da alma ou com os olhos da inteligência. 
Assim como na treva não há visibilidade, também na ignorância não há verdade.

"República", de Platão, Livro VII, 514a-517c


Na verdade, a luz ofuscante da verdade, caminhadas as passadas reflexas nas sombras de um despertar tardio, sombras que eram  convicção, espelhos partidos de alma que enfrenta de repente luz. Os passos, são dormentes, descrentes e cegos. Partida do  mundo conhecido, move-se no medo do que não se sabe, impossibilitada de olhar, guia-nos a luz que nos aquece, ou não.


Do outro lado da Lua, esquece-se o encantamento dos opostos conjugados, filosofia e caminhadas na podridão. Que saudades da linguagem expressiva e sentida, sem mestrias banais frutadas de primeira impresssão.
Impressiona-me o revirar das esquinas das palavras, conhecedora da essência tão única. Glamorizar a leitura é esquecer a alma vigente. 
Destroços de abandono e de espera descomprometida. Descrédito num mundo ocasional, pousado num telhado altaneiro repleto de sentir efemero que se esquece e despede.

Reformulo um conto que me fez viva, numa ironia induzida, como uma droga de curto efeito. Como qualquer outra, que antecede a próxima.

Fui vestida de um silencio que não esqueço. Sem semelhante, este embargo de peito, que me fere tanto.

Noite escura, cheia de mim e do despertar magoado do meu amigo.
Aceito o que mereço e desvio o olhar molhado para as minhas mãos. O que me habita, fica no meu direito.
A equação do meu valor. Como se despedem sentimentos que não são ideias?

Fica este ser tão amigo, que me ensina todos os dias.
O resto que se foda!

Não sei escrever hoje




Se falar agora, a minha voz ecoa neste espaço sombrio, se gritar o sentido que me toca, fico sem tempo de tão longe que se ouviria. Tenho os meus pés descalços rodeados de uma agua fria anunciada. Maré tão vazia quanto eu.
Se chorasse agora, os meus olhos não verteriam senão a cegueira que me envolve. Esgotados da água salgada que me aquecia tanto.
Não sei o que dizer.

Não sai nada.
O que sinto é um silencio que me leva a vida.
Queria pedir, calar esta voz que me soa, convicta, corsária de convicções, enganada, queria-me vista. Queria ser sentida mais que desentendida à semelhança de tudo o que não sou. A partida, vivia-a de medo, calada, descrente na mudança. Não muda o dia sem que a noite acorde. Vejo braços traçados, sorrisos por nada ou por tudo o que se nos assemelha, vejo a distancia trocada por albergues passados e luas cheias. Vejo a minha cara desfocada e potenciada em outra faces. Sou culpada, meia.
Não sei escrever hoje. Estou vazia , partida, sem vida.

O meu amigo está adormecido, de olhar triste, sem reacção. E eu, quieta, aguardo que acorde e me veja. A cabeça embrulhada numa amalgama branca, colada. Esperei que adormecesse encostado ao meu colo, gostava que ao menos ele despertasse e lhe pareça que não aconteceu nada.

28 outubro 2009



Meu amigo, logo vais adormecer numas mãos conhecedoras que te acarinham desde pequeno. Quando acordares, vou estar ao teu lado para te trazer comigo, como sempre fiz. És o meu companheiro de vida, o maior amigo do mundo.

A violência que tu não conheces, por não fazer parte de ti, feriu-te, não sei porquê. Se calhar, devia ter feito como tantos, devia-te ter mostrado a maldade, devia ter "treinado" defesas. Não sou capaz, gosto de ti assim, livre, amigo, com vontade de entrar nas portas abertas e cheirar tudo.

Gosto do teu olhar divertido, agora abatido. Não suporto ver o que te fizeram. Não suporto ver-te assim.
Quando acordares, vou estar contigo, à tua espera.
Queira Deus que corra tudo bem.

Sentido




Palavras e gestos, presos, sentidos de liberdade, vontade de uma fonte que não se esgota, que não se quebra. Estação caduca que tarda em expressão.
Sigo-te à distancia de uma mão, mão de vento em passos pequenos, tementes de um passado que me assombra. Sigo crente, sem certeza de nada.
Nos meus passos ensaiados em caminhadas que me deixava para trás, irracionalmente por te ver no ângulo da minha expressão. Zangada pelo desencontro de razão, pela culpa do sentido sem tempo e do tempo que esgota, certa de me querer calada e anónima. Sem as palavras esboçadas, cuidadas, feridas de um sentido tão maior que eu.
Sigo-te por não conhecer este meu lado, por me ter perdido dos meus enquadramentos cómodos, da certeza de não existir mais nada. Entendo tanto em silencio. Entendo magoada.
Às vezes choro por um egoismo carente, não te encontro, deixo-te à consideração da minha mente demente de tanto sentir. Outras vezes, domina-me uma razão contabilística, o meu haver foi o céu e o inferno e o meu patrimonio uma ausencia de coerencia.  Devo a dignidade, devo-me plena.
Envolta nos elementos que me engrandecem, vejo-te ao longe. Sei-te de partida. Incapaz de um aceno, imagino-te desmultiplicado e dividido em mil abraços feitos do nada que é mais que eu. Faltam-me pedaços, sabes? A minha razão é devedora e merecedora e não serve de nada.
Um senhor de bata branca disse-me há pouco tempo que a raiva escondia um medo fisico que me doi. Sei-me estranha de um grito silencioso que me assombra. Não vale nada, vale o silencio com que me escondo em  alegorias e metaforas coloridas que me dão vida.
Aceito-me como sou, gosto-me assim, meia tonta, meia terrena, sou crente na minha alma que te segue na crença que tem de mim.

太鼓


Taiko Drums

Um ribombar ritmado, pulsar de emoção que me treme. Um som absoluto que enche o espaço silencioso, atento.
Levei-o comigo na distancia que percorro, tardia, um poente avermelhado, misturado com a névoa solene. Segui mais à frente. Um campo castanho, cheiro a feno, parei e aspirei o que ouvia.
O som dos tambores misturados com a pulsação ajustada, o fim do dia, ensinava a minha mente dorida a esquecer. Cada vez mais alto, como um soar que se aproxima.

Perdi-me do tempo, cheguei atrasada, ofegante, valeu pelo momento comigo que fica.
Mil imagens, arco-iris com mais cores, saudades de um tempo em que eramos mais que regrados e pensantes, eramos alma drogada, eramos gente errante em busca de madrugada.

Saudades de não me deter, por nada, não querer saber o passo seguinte, albergar-me numa esquina pelo prazer de não ser.

27 outubro 2009

Do lado de cá



Do lado de cá, mal se vêem as sombras dos barcos ao longe, as ancoras, já arrumadas deixam o espaço que o cais molhado escondia. Lugar de descanso antes da partida.
Única, sem semelhante, os meus cabelos curtos prendem-me a face à terra que semeio, colheita salgada de ventania que florescerá um dia. Não divido  o som ao meio, não olho nascente, nem oriente, os meus olhos enchem-se de um só lugar, horizonte no final de estrada.
Memória minha, soam portas batentes, estridentes que ainda ecoam, outras que não vi abrirem-se e ainda aquelas a que espreitei, só para me despedir de seguida. À  porta da minha alma, deixo uma rosa pequena, com cheiro de Alentejo. Não se desiste do que existe. Despedem-se antes nas correntes amenas de novos portos dançantes.  Deste vislumbrar vibrante de um olhar apenas.

O meu nevoeiro é maresia que de clara faz um quadro. Loucura libertada da alma que viu o despertar de uma madrugada que ainda não foi dia. É como se deste lado, os contornos se fundissem, num emaranhado lindo. São dias negros de noites iluminadas. Caminhos que se multiplicam, dormência acordada, palavras que não se ouvem. É esta musica do tempo que, de passado, se faz hoje.

Iceland

Enganei-me no meu tempo. Há Sol neste dia.



Enquanto me esforço , em corte de maciço rochoso, deixo a minha mente seguir, para Norte, onde se cantam musicas, manta de sensações misteriosas, numa linguagem inexistente, melodias entoadas sem desvios de palavras. "Hopelanding" é emoção cantada por Sigur Rós.
Enternece-me a imagem de uma face doce, a mais bonita que conheço e que ouço desde pequena.
As cores boreais magnetizadas num Norte que me acolhe, quando o Sul se desmembra em alegrias e harmonias.

As imagens valem palavras, gosto destas nos momentos que me deixam ver o olhar que as pronuncia. De outra forma, quedo-me, escondo-me num medo fantasioso. Escrevo muito, como se me libertasse da prisão do tempo, como se os meus dedos me vivessem mais do que eu. Ergo-me, cada vez mais certa, numa guerra comigo mesma. Quero a minha calçada desenhada, por cada pedra conjugada, ordenada. Bebo agua de uma fonte fria que me aquece por dentro. Sigo

Eis-me viva da minha emoção desentendida, alimentada por cada dia. Sou tão critica como pareço, mas os olhos abrem-se à guarda que vou vendo, fundamentada nos alicerces do meu passado.
Há feixes de luz, neste dia, que pretendo construtivo, penso-me aqui, deixada nas asas do tempo.
Fortaleço-me e construo o meu caminho de pedra.

26 outubro 2009

Plena




Pronuncia gerundica, acordei envolta num nevoeiro que transpunha o amanhecer. Adivinhei o Sol por detrás, empiricamente assimilada a ideia de o ver por cima da parede cinzenta, prevê tempestade.
Ainda bem. Tenho vontade de chuva e de vento. Nessas alturas apetece-me passear, certa de encontrar praias desabitadas e colinas dançantes. Apetece-me o meu sitio de onde vejo, longe, mais persistência.  Vejo os elementos misturados, vejo agua imensa, vejo a terra onde piso, vejo vento e a minha cara que ferve.

Apetece-me passear na areia fria e molhada, salgar a minha cara, correr de passos marcados, apetece-me beber agua de uma fonte fria com as mãos em forma de concha. Apetece-me não ver gente, apetece-me o quente de uma fogueira.

Chamada antes evasão à minha verdade, quero ser acariciada pelo vento, tremer por dentro, quero perder-me nos prados verdes do Sul, sentar-me ao sol e comer uma bucha com um contador de poemas.
Quero as manhãs serenas de um despertar alegre, cheio de musica, quero encher-me de cada vida que os livros me dão. Adormecer sem querer, comer pão cozido em forno de lenha e tisnado de carvão.
Quero-me plena, no fim da estrada.

Estudar faz-me bem. Sinto que me apaziguo aos poucos, num mundo de papel e direcção. É um tempo meu. Alheada de outro mundo, acolhida em vontade de crescer que me faz aos poucos, regressar a mim. Devagar, formo uma imagem esbatida, partida a vida de deve e haver. Calma. Calma em mim que não sentia há tanto tempo, calma nascente num rio desaguado.
Parece soar ainda ao longe uma balsa envolta no nevoeiro que me retorna, solta de vontade e certeza. No cais escorregadio, as ancoras amontoadas e as redes rasgadas em desalinho. Seguem-no as gaivotas sem medo e carentes de ofertas. Não há luz, há o cheiro.
Sinto-o aqui de perto, na distancia que me ofereço, de limites e continuidades, logaritmos e uma vontade tremenda de me calar por dentro. Inspirar este cheiro, o nevoeiro que me ilumina.
Não pertenço a um mundo arquitectado de gestos propositados, agradeço-me calar o que sei que magoa em expressão. Não gosto deste mundo inventado e contado, antecipado e urgente de razão.
Tenho imagens bonitas feitas de mim, que só sei sentir, sentada numa pedra que trouxe em tempos, hoje escolhi ser. Escolhi estar comigo, lembrar-me do que dei, mais do que não, lembrar-me dos sorrisos que recebi, do que aprendi, dos sitios a que me levei.
Estou cansada de uma guerra que me fere tão fundo. Perdida nas minhas mãos. Conheço-me, sei-me esgotada, sei a vontade de me recolher, envergonhada, ferida e descrente de mim. Ergo-me comigo, como sempre fiz.
Esta noite tão calma, este silencio, as minhas mãos percorrem-me e secam-me do cais de onde vim. A minha cabeça hoje não doeu de tanto que lhe pedi. Sou mais que isto a que me reduzi.
Vou dormir nesta noite mais quente, encostada ao meu amigo, farto de não brincarmos, não corrermos juntos, como dantes. De olhos fechados, deixo um farol e sigo o meu nevoeiro. Iluminada, nos recursos do que sou e pretendo. Conheço a estrada em pensamento.

25 outubro 2009

Moldo-me de mãos de pedra

Queria arrancar de mim agora cada tempo em que me revesti de alegorias e preconceitos. Queria despedir-me da desilusão de mim mesma, região demarcada de um tempo que durou tanto. Queimei a minha memória com fumo prateado, falei para não me ouvir, segui instrumentos de tortura masoquista, fui impiedosa comigo, com os horizontes que criei em pequena. Entristece-me a desistência que prolonguei de mim. Entristece-me o tempo que passei orgulhosamente ausente, numa dormência suicida e carente.
Lembro-me de uma noite, o meu pai , sabendo-me companheira dos mesmos sonhos, me ter falado da luta que se anunciava, de olhar embargado, explicou-me a necessidade de poupança e sacrificio. Nessa noite, senti-me uma peça importante do meu mundo. Arregacei as mangas e cresci na convicção de orquestrar o meu futuro.
Via da minha janela, admirava os casais adolescentes, sorridentes que passeavam leves de vida. Não encontrava em mim o descomprometimento ilusório da desistência. Não conseguia. Sonhava ter um dia alguém do tamanho do meu horizonte, não tinha, não queria em expressão.
Da minha janela, os dias misturavam-se com as noites, visitavam-me em vigilia. Eu estudava, queria um sonho, queria corresponder. Questionava as vivencias e as teorias, escrevia muito, sentida que a vida passava  do lado de fora da minha janela, sem que nela me enquadrasse. Não tinha amigos, tinha livros, tinha a força do meu mundo.
Lembro-me das ferias que não tive, sentada ao lado de um estudante que me elevou o raciocínio matemático, que festejou comigo o valor na pauta, passagem ganha para o meu futuro. Lembro-me da minha convicção tão forte. Lembro-me agora.
O que aconteceu comigo? Que desmoronar de mim, que loucura, que vazio de repente se apoderou de mim...
Sinto-me agora latejante, sou simples, no meu mundo construido de selvas e planicies, de lutas e ausencias, de um acréscimo ébrio que me corta a respiração.
Sou mais simples, mais complicada, passei barreiras e reservas em nome de uma identidade perdida, somatorio de desistencias conscientes e um querer cada vez maior. Querer de mim, querer tanto.
Estou sentada numa cadeira, perto de uma janela onde os dias e as noites não deixaram de me visitar, mais reticentes, exigentes, reclamam que me veja.
Quem sou eu para não me corresponder? quem sou eu para soltar lágrimas reflexas de palavras que me ferem por prazer. Quem sou eu para assentir numa tela em que não me revejo?
Quero o meu sonho adiado, quero estudar, memorizar, quero ser capaz, mais que tudo. Quero o meu mundo que emana de dentro. Fundir-me nos dias e nas noites que me acompanham, pela fé crescente que se forma.
Não acrescento no presente que formo. Moldo-me de mãos de pedra, uma calçada que percorro. Minha, simples e saudosa.


Cheguei primeiro. Estou no alto de um negro sombrio. As luzes que conheço apagam-se ao retornar da hora. Tenho espaço, tenho tempo, tenho medo.
Grito eu tão alto que possa, grito calada do mais fundo que tenho.
Grito o silencio do julgamento.Não vês que te amo?
Caminhei até aqui, doeu-me andar descalça, vergada pela incapacidade de não saber fazer de outra forma.
Doeu cada momento de uma convicção da minha morada, da minha voz e de nada me pertencer.
Nada é nada. Nada é silencio.

Sei para onde caminho. Passos meus, sofridos. Horizontes coerentes que não vês.
De outro modo, não saberia, levo comigo uma vida que pretendo construida. Sonho com partilha, mais que oferta, sonho com a fidelidade sentida mais que falada, zangada por ser só minha, por nos momentos desprovidos de fé, ter-me a mim, sem mais nada.
Tenho na minha cabeça uma dor que dizem ser manifestação do meu sentir fisico. Não passa.
Levo comigo cada tropeçar, cada fraquejar, levo-me inteira e desperta.
Levo uma mão cheia de mais que palavras, de passos novos para mim, levo o tempo que precisei até aqui. Sou pequena, sei que sou. Sou um acordar urgente, como se me erguesse de uma dormência induzida.

A verdade é que mesmo em silencio, tu acompanhaste-me no rasgar mais duro da expressão. Obrigaste-me a enfrentar o medo que semeei por dentro. Esvaziada, é assim que me sinto. Os caminhos escurecidos, iluminam tão devagar o que sinto enfraquecido em mim. Percurso meu, de fantasmas cadentes, sem presença no meu destino. É contigo que eu estudo, é de ti que bebo nos meus dias.
Sem presença, estou contigo, sei-te sem voz, sinto mais que possas equacionar, por respeito.
Não rastejo na podridão da ilusão, sou mais que isso. Vivi o ceu e o inferno em formas inteligentes de moldar e planear. Despida, tu não me vês.
Não é a tua morada, habitas em mim, desde sempre. É o meu passo, o meu conflito de crédito.
Doi-me uma vergonha profunda, da minha fraqueza consciente de ser mais capaz, da verdade de mim.
Doi-me a falta de entendimento, num gesto distante e inquisidor, soado nas letras do abcedário e mais umas tantas composições alienadas.  Desistencia disfarçada e entoada de vento. num rufar de tambores.
Sou culpada, eu sei,  sinto por uma vida inteira que senti quase nada, mesmo querendo.
Olha o meu horizonte, guarda em ti a morada, eu vou por inteiro.
Na minha imagem, em campo desenhado, liberto por cada um, numa calçada de areia e de ardósia que aguarda as palavras que faltam,  de sol nascente e adiado ocaso, é assim que hei-de chegar, amanhã, onde pertenço.
Sempre tive o drama do atraso, sou vagarosa nos meus passos mais sinceros, tropeço, olho em volta. Mas é para ti que eu caminho mesmo sabendo que quando chegar, tu não vais mais estar. Porque algures no meu passado alguma voz me ensinou que me envolve o som efemero da desistência de mim.

Myrtilis



Percorremos cada rua, espreitamos nas esquinas brancas, sentimos a voz quente e curiosa das faces que nos viram crescer. As memórias que escolho são bonitas. Mergulho as que restam no caudal que conduz a outras, ao Sul.
O rosto imaculado desta terra poisado na serra quente, o castelo misterioso, a imortalidade de uma herança que nos move. Noites quentes, em debandada, como um sopro de vida que queria olhar mais adiante.
Hoje adormeço aqui, naquela escadaria que vai dar ao rio. Depois de vislumbrar um barco, sereno, atracado na rocha misteriosa que nos contavam ser guardiã de entradas e fugas.
Ouço as crianças de agora, ouço os antigos almocreves no convento, saudosos, com historias que ninguem perpetua em livro. Ouço as cidades soterradas, os enigmas do tempo.
Cegonhas misturadas, alinhadas, pontilhados brancos na curva da estrada tortuosa que leva à mina.
Aquela musica antiga que nos fazia tremer, o sibilar dos labios e o arquejar de voz grossa do avô Diogo.
Hoje fico aqui em pensamento, debruçada sobre um livro antigo.

Olhar por mim

Mais que um olhar gritante, sou eu hoje que me anuncio no despir de mascaras em que me encerrei sempre. Sou eu albergada num pensamento que me colhe sem entender. Sou eu que grito perdão, porque alguém ao longe, mil faces de uma só expressão, me ocultam voz  e feição. Sou eu em cada momento, cá dentro, em tudo o que me faz.
Sou eu que vivi em espaços confusos, num tempo parado, num tempo ausente, em que me anunciava sem nunca ter estado presente. Dei tudo de mim, tudo. Dei-me sem existir, dei-me sentida, despedida de cada elemento que me perfaz. Doeu-me a desilusão, a despedida da minha vida em troca do meu vazio.
Posso delinear mil teorias, posso construir mais explicações, sou uma tonta que me esqueci de mim, quase por uma fé na mudança, por um crédito numa luz que me parece só ter sido vista por mim. Ilusão.
Sete anos. Tantos dias limitados a um só. Silencio, silencio, vozes desiguais, submissão.
A minha voz de dentro, calada, zangada pelo virar consciente de costas à essência que me faz, minha. Apagada em mil considerações acerca do certo e errado, dos horizontes escondidos no meu olhar, só isso. Alimentei-me de viagens solitárias, de estradas salgadas, de horas que passava sozinha, onde queria, como queria.
Afastei-me de mim sem perceber. Tornei-me dona de casa, empregada convicta, calada, também gritei o quanto podia, julguei-me louca, sem mim, em troca do nada em que me erguia.
No dia em que me ouvi, calei-me. Envergonhada da minha própria fronteira e derrota. Neguei-me em gestos de auto destruição que não esqueço.
Vi-me ausente, defronte à minha imagem derrotada. De ausencia plena, vi-me longe, sem estrada, contada em historias de tantas. E eu negava, neguei sempre.
Neguei-me envolta em doença, neguei-me sozinha naquela escadaria que me assusta, neguei-me no silencio que pedia tanto. Neguei-me na herança de quem amo tanto. O olhar do meu pai, sabedor de mim como mais ninguém, inquiridor sem resposta, a minha mãe, que me visitava e julgava a mudança detorpada.
Fraca, disfarçada, sou eu que me lembro. Não da vivência banal, lembro-me de mim falsa, lembro-me cada momento importante para mim, feito de neblina e eco.
Também eu sou boa pessoa, esqueço-me pela fraqueza de absorver julgamentos. Sou quem mais se esquece  de mim.
Sete anos desenhados de cores esbatidas, deambulantes como um fantasma de tempo.
Vi mais do que julgava ainda haver, destruí conceitos e valores verdadeiros. Alma, voz, eu por inteiro, uma vez, uma vez.
Desgraça é este passar de memória. Desgraça é esta voz de dentro, aprisionada, sábia, este instinto que não ouvi.
Estou esvaziada de mim. Encontrada, sentida, de um sentir do tamanho do meu mundo. Estou vergada à culpa da minha verdade.
Estou naufragada no meu direito de ser, verdadeira, inteira. Na minha fraqueza de pedir, de mão estendida, por medo, fé destroçada, perdida, depois de me ver. Estou dispersa no erro dos meus gestos, a mentira era a verdade mais sentida que julguei ter.
Hoje, sou o tanto ou o quase nada que sempre mostrei.
Há um horizonte, um sol, duas luas, um mundo inteiro que quis para mim, há este meu ser verdadeiro que já não sei adormecer. Há amar por inteiro sem que a conjugação seja necessária, há esta estrada que percorro na minha direcção, tão vazia como sempre, imaginada de sons e de cheiros, de silencios entendidos e de olhares concordantes. Há um bando de passaros migrantes que quero seguir, sem saber.
Não me sento na tribuna, não me faço juiza, nem julgada. Sou alma.
A voz que me salta, despida, tão cheia de vida, num tempo desconcertado e errado, sou só eu.

Minha amiga bonita

Fico contente, tão contente, minha amiga, pelo caminho que seguimos, juntas. Pelas cores com que pintas as palavras. Fico contente pelas expressões que nos fazem rir e chorar, pela vida contada na primeira pessoa. Fico contente por este tempo que custa a passar, e que iluminamos com gestos motores de um sorriso e dois abraços à distancia da voz.
Ontem, ouvi outra amiga que sendo tão grande, se vê pequena. Castrada de voz, enganada de opinião. A unica expressão sentida, silencio. Apeteceu-me dar o que não tenho, só para a ver sorrir. Falamos do que temos no mais fundo de nós, na vida que passa sem que embarquemos, no medo da nudez dos sentidos.
E tu, pedaço de Alentejo singelo, és tão bonita no que és.
Estou contente por palavras minhas serem dignas da tua tela.
São só as loucuras que aqui deixo, sendo mais soltas que eu própria.
Gosto tanto de ti Marta!

24 outubro 2009

Liberdade II

A mim incomoda-me o hastear da bandeira da liberdade de expressão em vulgos saberes inquisitórios e opinativos. Liberdade de expressão, liberdade de opinião e de  aceitação. Liberdade são duas asas soltas. A da expressão e da inspiração.
Liberdade é, antes de mais a ousadia de ser estupido em crescimento. Mas ser. Liberdade é crescer por dentro expirando vida. Liberdade não é o efeito ou a consequência de julgar, sendo que a isso temos direito. Ter massa critica é pretender esboçar opinião que seja aceite, como tal.

Sendo eu, voz pequena que tenho sempre qualquer coisa para dizer, aproveitava para explicar, muito bem explicadinho, antes de mais a mim mesma, que me move a convicção mais profunda da importancia do acesso universal a informação. Sobre isto, relembro os filtros da razão. Entendo e conheço, se me informo e sinto. Há estimulos internos e externos, nos conceitos que absorvemos.
Criam-se formas incoerentes de entendimento quando, antes de saber, já pensamos saber mais.
É como sentir. É livre e de acesso universal.
Depois maneja-se ou teme-se ou vive-se. De sentir e conhecer até conhecer, existe um compasso marcado por cada um. É liberdade também.

A fé que tenho, grande, maior que a opinião, não se conhece, não se entende, sem ela, sou o nada sem expressão nem opinião.

O  meu amigo fez ontem 5 anos.
Dizem que a gora é  um senior.
Hoje, dei-lhe uma prenda e um abraço sentido. Lembrei-me da primeira vez que o vi. Nunca mais nos separamos. Conheço-o como ele me conhece a mim, acompanho-o orgulhosa do carinho com que me presenteia .
Acolhi os amigos que me entram agora pela casa. Todos os dias tenho três caudas a abanar à minha frente, enquanto distribuo bolachas. Se há melhor, não conheço, nem acredito.
Parabéns Xico!

Liberdade

Fui criar rendimento, investir no que me importa, munida do meu cartão de crédito, fui comprar livros. De um intento, fiz uma hora, absorvida em textos novos, livros que gostava de ler, conversa com o senhor do balcão. Com a sensação da vulgaridade do tema actual, questionei-me acerca do som de manobra de marketing, ao gostinho da gente, na montra, a par, vende-se Caim e a Biblia. Dois best sellers emergentes, decerto.
Quem pretender dar azo à liberdade de expressão, tão em voga, pretende-se documentado na ambivalência de perspectivas que a mim, me chateiam profundamente.
Como disse Turgot, " A liberdade é o direito de fazer tudo o que não é contrário ao direito de outrem".
Na minha mera opinião, reduzo ao mesmo, as expressões de um passado deformado, a cegueira da nossa submissão aos titulos honorificos e nobiliarquicos, e por isso, a opiniões superiores e outras que nem tanto.
A liberdade de expressão, é igual à liberdade da fé. O direito de um louco dizer tudo o que lhe vem à cabeça, é a mesma que a crença abstrata da fé. Ambos se dispõem a ficar a falar sozinhos, sem plateia.
Este caso, soa-me a falso. Soa-me a manobras que engolimos. Se é um Nobel, corremos a comprar Caim e a Biblia e vamos todos discutir o assunto. Objectivo alcançado.
Eu gosto de Lobo Antunes, do conceito de gostar de quem dá amor e de quem usa uma gravata que não se vê. Gosto do anonimato de opinião que não sucede os desvios por titulos, gosto de palavras mais que de faces, gosto de discussões mais que imposições.
Ao sr Saramago, atribuo a opinião, que subscreva ou não, é meramente uma opinião, esboçada na sua liberdade de a expressar. Tiro o mesmo das imposições catedraticas episcopais, arcaicas, são doutrinas. Movem almas em contornos de uma fé. E essa, admiravel, tem ela própria o direito de existir.
Mas como se fala nisso, vamos todos ler Caim e a Biblia. Somos seguidores sem individualidade.
Eu comprei o SNC explicado e vou tentar ter também uma opinião acerca disso.

23 outubro 2009

Senhora

Hoje, na estrada, um campo de oliveiras ainda carregadas, uma erva verde e fresca , ovelhas envoltas num nevoeiro altivo, uma manta posta, uma mão cheia de azeitonas e uma mulher rosada, sentada. Parei. A primeira imagem sempre erronea, adivinhou tristeza, um olhar distante, vazio. Imaginei que urgisse um gesto meu.
- Boa tarde, senhora, está tudo bem?
A mulher, olhou-me com uns olhos claros que se iluminaram de repente, como o sol que desponta por detras do monte, de surpresa; sorriu, um dos sorrisos mais bonitos que já vi, misturado com as rugas expressivas que a alma lhe deu.
- Está tudo bem menina. Estava a descansar desta luta... E com a menina? Como vai?
A pergunta oferecia uma resposta, tinha uma espera por mim. Aguçou o ouvido e levantou-se sacudindo-se. Respondi.
- Comigo tambem esta tudo bem, senhora. Tambem vou à minha luta, lá para cima, para a serra.
- Um dia santo, e cuidado com o nevoeiro, menina.
Sorri eu, agradecida, sorri mais que podia. Segui.
Foi a conversa mais pura do meu dia e aquela imagem, levei-a comigo.
Estava tudo bem com ela e com o seu sorriso.
Esta noite li-me como uma estranha. Soava-me a mim parecendo tão negra.
Zangada, distante dos sorrisos que me constroem, dos quadros, mesmo que fantasiosos, com que me ilustrava, saudosa da neblina que o mar emana e das planicies que sei verdes, reticente em me refazer falsamente ou ainda esboçar raios de luz, preencho-me em memórias do que hei-de ver. Lembro-me das imagens que me precedem, recordo sons quentes, calmantes e a não necessidade de palavras.
Tenho tão presente em equações as horas em que me transformo, ambulante.
Construo o meu amanhã, num raciocinio consciente, vislumbro o meu exemplo nos actos migratórios de seres que mais sabem de mim.
Chorar faz-me bem, não é um soltar de lágrimas piedosas, é um sopro de sentido, alivio cheio de sentimento. Nestes tempos tenho chorado por musicas que ouço, por memórias e silencio, por mais cheia que egoista, arrecado o meu espaço ermo, em palavras alexitémicas intransigentes, com que me esconde do mundo.
Este meu espaço tem sido o meu companheiro de pensamento, revejo-o em conflito, tão certa do meu desnorteio. Sem inicio, sem fim, com a sensação de um compasso entre dois tempos por demais importantes para me adormecer.
Desconfio da coerência de raciocínios e da fluidez de sentires. O meu silencio é sentido e as palavras remoinhos.
Há um grito enorme cá dentro que sei ter de soltar, não quero esta angustia, não quero tanta coisa que me encerra agora. O meu egoismo levou-me a julgar merecer o equivalente ao meu sonho, em gestos concebo a fraqueza de os não saber alcançar, mesmo sabendo. Aprendo, todos os dias, calando a certeza que a dor nos engrandece, sinto elevar-me de um vale adormecido, de um passado julgado esquecido que agora percebo o tanto que me arrebatou. Quero as minhas raizes ancestrais, quero a essência de mim, protagonista do meu presente. Está aqui, sinto-a cá dentro, sinto-a presente nos momentos comigo, rasguei-a, menti-lhe confiando-lhe condicionantes, descrédito e medos.
Ontem, cheguei a julgar-me incapaz, duvidei da minha inteligencia, da minha capacidade de lutas que travo comigo.
Quem me julgo eu para duvidar de mim, sendo eu própria culpada do meu descrédito?
Quem me julgo eu, nas palavras que não me pertencem, nos sentidos esquecidos e na distancia que passivamente adoptei ?
Sou eu quem me enfraquece, sou eu que se esquece de mim.
E, porém, sabedora em caminhos e sentidos, do incomportavel alcance de assim ser.
Assistem-me os meus passos, cada horizonte, cada poente e nascente do meu dia, o direito de sentir, sem julgar, sem me ofender, assiste-me a obrigação de aprender, de me encontrar, seja onde for.
Não me vejo arquitectada, não me imagino no final de um dia, igual aos outros todos, não me imagino sem sonhar, sem conhecer, sem viajar, sem amar depois de saber que sinto, não me quero albergada numa vivência enquadrada, por mais "correcta" que seja.
Ontem, rodeada de um molho de gente gritante, aos quadradinhos, limpinha e em coro, olhei as minhas botas enlameadas, o meu cabelo desgrenhado, as pernas cruzadas e uma vontade de chocar.. E gostei tanto de mim.
Gostei de me lembrar da D Lucia, da força da admiração mutua, da vontade expressada e marcada, gostei de me embrenhar nas pedreiras castanhas da serra, do carinho que me envolve de gente simples e plena. Gostei de não perceber nada de matemática, de não dormir a pensar nisso, de me sentir sozinha por significar estar verdadeira, gostei de, em vez de esconder, perceber o privilegio desta minha forma de sentir que não sabia haver em mim. Doi de verdade, mas é minha. Viva.
Não tenho espaço de aceitação. Não sou de trato facil. Sou apenas a vontade de caminhar.

????

Aquele homenzinho dos logaritmos, infinitos e exponenciais está aos poucos a tornar-se uma causa da minha falta de sono.
Hoje desatei-me a rir com ele, e isto acontece-me quando ultrapassei os meus limites todos.
Mas continuo a gostar de matemática....

Saintes Marie de la Mer




Percorri descalça esta praia, numa despedida cega de dormencia induzida. Julgava então não ser capaz.
O Mediterrâneo mostrava-me a vida e eu, morta por dentro, pedia.
Mais tarde, noutra vida, renasci trazida deste ser que esgotei em caminhadas sombrias e tão fartas de mim. Aqui chorei embalada por um abraçado imaginado do meu pai, que me esperava no tempo seguinte, com uma presença que só ele tem.
As sombras dos flamingos, os ciganos, as musicas que dancei entre dois caminhos.
As minhas memórias.... Lembras-te, pai?
Ensinaste-me mais que o mundo que conheces, ensinaste-me a não querer menos que a vontade de o viver.
Somos tão iguais que só nos entendemos num silencio que às vezes me custa perceber.

22 outubro 2009

Oios



Espreito nas janelas, desço cada degrau, aspiro um aroma conhecido e silvestre, os sons das gentes com vida, as cores que se me oferecem e, naquele parapeito em baixo, sentada de pernas traçadas, abraço o mar e os montes, agradeço a distancia que me descobre.
Aqui, num mar fluido entre montes, um casario grego que me encanta, acolhe o meu sonho.
Descubro a imensidão da vida, sei que estarei aqui, um dia e em cada lugar , sempre.
Talvez por herança, talvez por não pertencer, encontro-me em cada lugar que me encanta.

Vou para as aulas, é também meu portão azul de esperança e de luta.

Nem mais nem menos



Lembro-me de ver esta imagem, há muitos anos. Fascinada por cada elemento, não esqueci.
Cansada, impregnada de teorias e continuidades, de dias comigo e da tempestade por dentro, ainda sem sono, adormeço aqui. Sem mais nada.

Ego


Documentei-me acerca de uma palavra que me assiste estranha. Ego. Por definição, não será mais que o "centro da consciência inferior", é o somatório dos meus pensamentos, ideias, sentimentos,  memórias e percepções sensoriais. 
Dizer que se tem "ego cheio", significa assim que o cumulo tem plenitude e deriva de um preenchimento de cada um dos elementos. Ter o ego cheio, é ter muitos pensamentos, ideias ou teorias por experimentar, é sentir muito e ter uma mão cheia de memórias e sentidos.
Liderar-me, no sentido de me planear e organizar, significa gerir o meu ego. Se entender que este, tornado consciente, comprova e aceita a realidade, induzido por desejos e objectivos racionais, o meu ser inferior é fraca ferramenta que manejo.
perco-me no raciocinio, no planeamento dos meus passos que mal vejo.
Sorrio à minha consciencia inferior assim e peço-lhe, humildemente, que não deixe nunca de distorcer um mundo que não gosto, de ter a ideia que sou o contrario do que vivo, de sentir mais, de me encher a cada momento das memórias que me ficam, sem lugar a filtros racionais. Que me estenda todos os dias no horizonte do que aspiro.Doa o que doer. 
Aceitar a realidade consciente é hoje, pesado demais.
Por isso me sinto tão pequena e, provavelmente de "ego tão cheio".

Prefiro o que sinto, ao que penso






Este frio que me aquece, agua que jorra em terra ainda quente, cara molhada, salgada de um vento que passa, leve, sem tempo. Do alto onde me deixo, que me alcança na distancia do que vivo.
O meu dia não tem nascente, nem poente, como se o despertar não pretendesse chegar.

As palavras que esboço, desiguais por serem minhas, são sopros que não contenho.
Sou tão mais que apenas isto.
Porém, sou pequena. Sou uma parte do que alcanço, decidida numa escolha que me assiste. Prefiro o que sinto, ao que penso. Sou antitese do que mostro. Sou pranto, em cada sorriso com que esboço os meus dias.
Não separo conceitos, não consigo. 
Na verdade, o que aprendo é quase anedótico, como se o empirismo se sobrepusesse à razão com que me envolvo. Falsa, falsa, tão falsa que me doi. Em cada contexto, sou arquitecta de junções e convicções. Tenho razão. E sinto. A minha cara tanto ferve porque amo, como porque me lembro. Solto lágrimas de raiva e de vazio. Não há poente em mim quando sinto. É meu!
Hoje, no alto, calada, saboreava o vento forte, a chuva que gosto e pensava, a raiva esconde o medo e a vergonha. Capa arrogante sem rosto. Lembrei-me de vivencias minhas, de episodios continuos repletos de uma espiral de desilusão e descrédito. Tão poucas as pessoas que deixei entrar em mim.
Como se parte da minha vida fosse uma caminhada ausente de cada espaço que percorri. Valia a vontade de um dia me entender. Lembrei-me dos homens em que me procurei. Poucos. Experiências marcadas a custo de batalhas comigo. Nunca inteira...
Sou tão mais que isso. Trouxe comigo, de cada nascente em que bebi, medo, um descrédito que se mistura com a minha imagem reflectida num espelho.


Hoje desperta, num dia que não começa nem termina, sou mais do que sinto, despeço este pensamento. Não sei, adormeço. Naufragada num sentimento que me esvazia, contrario a cada convicção, superior à ausencia e ao silencio, um gesto meu, só meu. 
Sou capaz de mover mundos, sei que sou, o meu está distante, num ocaso sem sentido, falsidade que me convém para não me magoar mais ainda. 
Tenho tantas teorias correctas e fundamentadas de causas e efeitos, de gestos e de medos, de raivas simbioticas e luzes ofuscantes. Não me interessa. Não me interessam as divagações acerca de conceitos exacerbados. Sou eu que amo sem me entender.


Medo de ser igual, nunca o sendo, medo de me doer o que já me destrói por dentro, medo da banalidade da desilusão que não sinto. Culpa desenquadrada, sem expressão, é a mim que me acompanho desde que me lembro. Medo do meu raciocinio que nunca expressei. As palavras que me viam, análogas a tantas, esboçadas em outros tempos. A crueldade gozada e antecipada em vagas altivas. Se me leio, apago. Agora deixo apenas os meus dedos viverem.
Não acredito. Acredito. Mudou tudo, não mudou nada, não pertenço onde estou mas estou, por medo, quero tanto o que não vejo em mim.

21 outubro 2009

Cuidado, ele vem aí...

Provavelmente, o editor de texto já actualizado com o novo acordo unilateral do outro lado do oceano.
Os agás, não diferenciam os onde e os existe, os c suprimem-se na dedução do pato assado e do de varsóvia.
Deve possuir também uma calculadora cientifica, para não se perder tempo com calculos despropositados que obrigariam, pelo menos, às noções mais básicas de aritmética e, ainda deve vir com a imagem de um Engenheiro qualquer no ambiente de trabalho.



Assim, estatisticamente, continuaremos a caminhar na aculturação estimada.
É o que se quer.
E não sei quando, provavelmente já amanhã, vai haver futebol.
Para quem não trabalha, mais uma chuva de cultura nas manhãs de qualquer canal.
E viva Portugal!

Ainda não percebi se a alusão é ao Fernão, o que deu a volta ao mundo, com meia duzia de utensilios e uma visão unica. Que Deus o tenha em descanso. Esse, ao menos, defendia o nome luso com alma.

20 outubro 2009

Derivadas e Limites



Sem comentários.
Sempre gostei de matemática.







Empenho-me em reminiscências que teimam em não se mostrar, equaciono a minha capacidade de perceber um homenzinho pequeno, irritado por não chegar ao quadro. Aulas alucinantes de revisões que culminam numa estranha vontade de rir.
Ainda tenho esperança.
Tenho uma persistência que não me deixa sequer dormir.
Tenho duvidas. Se as tenho, significa que assimilei ao ponto de não completar o raciocínio. O escrevinhar e apagar num quadro branco, à velocidade da luz, tem significado uma dor nos musculos da mão direita.
Que seja.
Eu ainda gosto muito de matemática.
Raios me partam se não consigo.

Bem vinda, chuva

Às vezes, penso nisto. Penso hoje que a chuva é bem vinda a esta terra. Que saboreio o cheiro da erva molhada e piso a água que sobra.
Penso nas pessoas que sinto. Nas poucas de quem gosto.
Penso que sou egoísta ao ponto de as saber sem tocar, sem muitos gestos concretos que o reforcem. Mas é só porque o meu coração transborda delas, distantes todas fisicamente.
Tenho um mimo excedentário de infancia. Veio de uma velhinha linda que me acolhia no colo e me ouvia enquanto me afagava o cabelo, de uma mãe terrena e serena que me ilumina o caminho, de um velejador ausente, de tão presente num amor desmedido. De uma irmã linda que me conhece e acarinha, como sempre. De umas luzinhas pequenas, que me aquecem com sorrisos e brincadeiras.
Tenho no meu coração cada momento que ficou, que me marcou. Não são muitos. daqueles que enchem um olhar, que ultrapassam a razão, que transbordam de sentir.
Tenho uma solidão preenchida. Como se nos dias que passam, me fizesse acompanhar, mesmo que perdida.
Sou mimada por isso. E, em vivencia, caminho comigo. Conduzo sozinha, almoço a ler livros e marco-me em sitios que escolho.
Mesmo assim, tenho umas mãos pequenas, que se movem sem impulso, por sentimento. Têm o alcance do vento, visitam num instante o que me ilumina e estremece. São os meus gestos mais sinceros, aqueles que não  se expressam. São luzes que ofereço, sou eu desarvorada, sou eu encontrada no que me viveu e ficou. São pedaços de mim que me completam e não são meus.
Sou mimada ao ponto de chorar por nada. Eu sei porquê. Sou antitese da imagem, sou a ultima impressão.
Em mundos separados, completo-me, por isso não despeço a minha sede de sonhar, mesmo à distancia.

Chove muito enquanto escrevo. Gosto tanto de encarar o céu e molhar a cara nesta altura.

James Newton Howard

Este Senhor, que procurei conhecer melhor depois de descobrir a autoria de uma das musicas que mais gosto, "Solomon Vandy", no filme Blood Diamond, parece-me genial.



Não conhecia, mas valeu a pesquisa.
Estou impregnada de mau feitio. Já gritei como me aconselham, já me cruzei por acaso comigo e desentendemo-nos, já estudei quase nada, já fui e vim de não sei quantos lugares e já me vesti por inteiro.
Não dá certo, dá-me jeito de vez em quando, ver o mundo como eu quero.
Trocam-se lugares, sorrisos em caras desfeitas, discussões metafóricas que não criam nada, um percurso que não quero, intenções.

Tenho saudades do meu mundo inteiro.