19 agosto 2010

Gosto de viajar de noite, de abrir as janelas do carro e sentir o fresco revolver-me o rosto, gosto da mescla de luzes e do mistério que os meus olhos adivinham. Gosto dos viajantes que se cruzam e do café mais saboroso a meio caminho. 
Parei um instante para esticar as pernas, um casal sentado nos bancos de piquenique, aqueles que se constroem para ninguém fazer uso, sem sombra nem sentido, saboreava vivencia, via-se no olhar que cada um oferecia, num entendimento mais sabio que qualquer conversa, imaginei que se beijavam na presença, se tocavam no sopro calmo dos anos passados unos, mais que o tempo lado a lado. Pensei que a felicidade, seria assim, que saboreassem um sentido que só eles conhecem, que se rissem daquele boné com a bandeira americana que acabara de passar, que ousassem o prazer do silencio. Sorri e sentei-me com eles. Rumavam a norte, procuravam fresco e um mar desocupado, brincavam com as mãos e as palavras, eram eles farol distante e claro, numa praia que os esperava.
Disse-lhes que era de Santarém sem nunca o ter sido, que ia para casa sem pressa, que tinha sede e ia comprar agua. Não precisava, eles tinham, e uma bolacha caseira que me soube a uma seara quente. Tinham um cão castiço que brincava na relva, marginal sem trela nem açaime. Contei-lhes do meu amigo e da tristeza que não passa, da ansia de me juntar a mim no pedaço que ficou em falta, calma, ele aparece que um amigo assim não se  perde nunca, que onde quer que estivesse tinha com ele tudo o que nos demos. Soltei uma lagrima por não saber como sentir senão chorando sempre que me lembro. Não era um cão, não, é mais que isso, companheiro meu, amigo, que não encontro o rasto.
Ficaria ali, gosto de falar com as faces que me parecem chamar, não são estranhas, não mais que as mascaras que se passeiam em cada dia sem deixarem pegada, são vozes achadas no fresco das noites, na calma de uma lua branca que espreita. Gosto das pessoas que me deixam um abraço quando partem, gosto das conversas francas por nada haver a provar ou manter, gosto de espreitar nas vidas coloridas e a seguir pinta-las com mais cores ainda. Gosto das histórias, das vidas.
Estava combinado, não nos veriamos de novo, mas naquele banco de pedra, ganhei uma migalha de vida que trouxe comigo.

1 comentário:

Jorge disse...

Olá Milhita,
Passo por aqui para matar saudades e deixar um abraço amigo.
Gostei de ler este texto que acho curioso, expressivo e surpreendente.
J