02 outubro 2011

A manhã cheirava a um fim condizente, de cores quentes e musica que abraçava o rio em baixo. Na sombra, em cada banco, havia uma história que me entretive a ouvir, sem que de palavras se fizesse, é o reflexo em cada espelho, nas caras serenas, outras zangadas, onde sempre me revejo.
A manhã falava baixinho, havia guardado os cheiros porquanto os sentidos se enchessem de salva e alecrim, e respirasse este bairro antigo que fez tanto de mim. Aqui estudei um tempo, aqui me encontrei e perdi, experimentei saciar tanta sede sem receio, sem esta vida pesada de passado e presente, vim aqui tantas vezes, olhar a cidade onde cresci. 
Imaginei a mulher dobrada sobre um jornal amarelo, passando pelas horas bebidas de historias que lhe roubam a solidão, o homem ávido de agradar a cada rebento que o habita só nestes dias por obra de um qualquer fim. Imaginei-me a mim, perdida aqui, sem antes ou agora, só aqui. Com o mesmo brilho que não sai dos meus olhos, feito das memórias, dos instantes, porque não guardo muitas histórias, guardo os sentidos, a dor de estômago de calar a resposta, o calor da minha cara tocada, as mãos dadas que me valiam o sustento de um horizonte bizarro que não era só eu que via. Guardo as palavras enfeitadas, espelhadas do que não se dizia, "os meus trapinhos" coloridos, aquecidos de nostalgia, nem sei de quê.
Precisei de tempo, para ver o que não via, mesmo sabendo. Precisei de crer que a honestidade me salvaria, que as vozes concordantes me devolveriam; precisei de me zangar comigo, de gritar alto e de tempo para me desiludir e trair, de tempo para desacreditar e amar um momento, e mais tempo ainda para me sentar aqui, num mesmo banco com cheiro a madrugada e deitar uma lágrima, por nada ser assim.
Sou a mulher do jornal amarelo, transparente a quem passa, fugidia de mim, mesmo sabendo, desconfio da minha capa, conheço a cara tapada cujos olhos ainda sonham e choram por nada, porque ainda sinto e não passa. Este tempo, deu-me o maior sonho escondido, deu-me vida e matou-me um pedaço por dentro. Agora, contar-me a história que vejo, seria baixinho para só eu ouvir.


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