07 março 2010

Tinha saudades da vontade com que o dia me acordou. Há tanto tempo que não abria a janela de par em par e ficava ali, um instante sentada, com o ribeiro que passa por trás, e a manhã raiada que ocupa o alcance do meu olhar. Já não me lembrava da luz. 
A árvore que plantei, pequena, hoje dançava de branco, e haviam pássaros pousados nos galhos. 
O som era mais forte esta manhã, o ribeiro transbordou, e os milheirais são lagos castanhos, e os caminhos, não os encontro ao olhar, sei de cor onde estão. Por qualquer motivo, os meus olhos fechados, sempre viram mais que as imagens que pretendi reter. Sei onde estão, percorri-os muitas vezes, sem direcção.
Tinha saudades de me querer.
Distante da multidão, por ser preciso, fui admirando a paisagem transformada, sossegada por ora, vi o campo de girassois concordantes que nascerão mais tarde, o Sol Nascente que aguarda a chuva bem vinda, vi vida por detrás dos montes, soltei-me de um pensamento demasiado elaborado que me assola. Sou agora, só isso.
A orquestra de nomes e sobrenomes com que me vesti, pesados de um fado que não me alenta, que não me tece, sou-me despida, distante, reconhecida mais ainda de cada pecado interior.
Não sinto falta de corpo, a minha cara febril guarda uma herança que me fica.
Tenho um gorro de lã, um casaco quente, lama nas botas e esta manhã trouxe qualquer coisa que, não sabendo o que é, tem um sabor doce, da cor do trigo.
Tinha saudades de conversar, de rir e dizer parvoices. De coisas simples como aqueles biscoitos antigos que a minha avó comprava com sabor a limão. Ainda se fazem, a vulso, na loja do Simões.
Já não me lembrava que a minha alma tem alma, que a minha mente desassossega-me e que o que sinto é maior que palavras esboçadas a um vento que passa.
A febre, ameaça, reserva da pressa que tenho em chegar. Não vejo o caminho, mas sei onde passa, sei onde está.

2 comentários:

Sonhadora (Rosa Maria) disse...

Minha querida
às vezes precisamos desse momentos...gostei muito do texto.

Beijinhos
Sonhadora

Luz disse...

Minha querida amiga alma de Luz,
Saudades de me sentir aqui ainda que todos os dias leia o que escreves e, quero colocar em ordem alguns comentários ainda que ande "ausente" como sabes, mas voltarei :)

Como gostei de ler-te, de sentir estes teus sentidos, os cheiros, os sabores, os sons, que nos trazes e, que me fizeram recuar no tempo e também saborear momentos simples como estes que são tanto de nós e, de uma simplicidade que nos satisfaz mais que qualquer outra coisa que nos possa ser dada.

Gostei de caminhar aqui contigo, como gosto sempre; encontro-me tanto aqui!
Obrigada minha amiga, recebe um abraço forte, apertado de Luz