16 dezembro 2009

Memória

Sentavamo-nos numa roda  do alto da cidade iluminada, fumavamos e riamos por nada. Descobriamos que o toque das mãos era mais quente que detonante, que as pernas entrelaçadas nos uniam mais que as palavras que já conheciamos tão bem. A noite acompanhava as histórias que escolhiamos de entre as memórias que queriamos que ficassem. As outras eram iguais, crediveis de tão silenciosas. Eram as marcas no corpo, eram os rasgos no peito e as mãos que se estendiam.
A lua era nova, e o cheiro que nos impelia, que dava vontade...
Havia sempre uns que partiam a meio, quando a vontade era mais carnal, quando o desejo tinha horizonte e sujeito. Sem palavras que atrapalhassem, sem acenos porque voltariam, era só mais um passo em jeito de vida que se queria tanto.
Eu ficava porque tinha medo, porque não era ainda a minha despedida e a minha fronteira, sombranceira à muralha restava ainda um rasgo de estrelas que dizia só minhas, meu segredo, meu prazer supremo. Eu ficava e dizia o que sonhava, de pernas traçadas e cara ardente. Queria ser tudo num momento, queria a Lua cheia e o mar levante, queria viagens sem chegada, queria ser amada tal e qual como não sabia ser possivel, queria encontrar palavras para o que sentia.
Dos que ficavam, serenos de um fado anunciado, de olhos brilhantes no alto, enfeitiçados, lançavamos vontade de ficar enlaçados sem laços, em nada, feitos da vontade de descobrir o prazer que não acaba. de encontrar o reflexo na agua.
Hoje..
Tantos passos, tantas trocas, caminhadas que a cara mostra, que o tempo guarda, a mesma vontade rarefeita em pedaços de vida, em rasgos de prazer e de ser. Rugas e cabelos grisalhos, a mesma voz,  acho-nos ainda mais bonitos, mais brilhantes da puta de vida que já não ri tanto para nos deixar sorrir a nós.
De mil palavras faz-se uma, a de sempre, vontade...
"Amas?"
"Eu amo!!!"
Que bom, afinal valeu a pena a caminhada !!!!

1 comentário:

António Conceição disse...

A memória é muito boa, o final nem por isso. Quando alguém pergunta "amas?, é porque sabe que o outro já não ama.