18 maio 2010

Sera


Quantas vezes me despedi de mim, mal me despertava para um caminhar ensaiado, corrido e sem nexo a que me ancorava de vida? Quantas vezes me desdisse na ansia de me quedar num abrigo sombreiro e despido?  Quantas vezes cruzei um mar sem cor nem cheiro? e as pedras nos ribeiros que nunca senti? Quantas vezes se fez dia sem que o visse? E as noites, que sozinha me via passar sem vida?  Quantas foram as horas que me falavam sem me despertarem os sentidos?
Despedida é uma palavra sem cor, feitas de todos os dias que não se vivem, porque na minha cara quente há uma vida maior morta de ausência e nascida do que o silencio transborda. Os contrários falam mais que os simples conceitos.  Despedida não tem morada, nos meus olhos ofuscados do que precisei morrer para vislumbrar. Despedida é a pegada demorada das palavras, vãs e marcadas de um pensar coeso e envergonhado que nos faz crescer. Despedida é o cais que nos rouba o sentido.
Desperto com o raiar da lua, choro por me doer tanto e sorrio pelo conto eterno que não manejo, é cor, é espuma, é vaga solta que mora em mim.
Quedo-me de fronte aos meus olhos e desperto-me de cada momento em que me vi. Um instante , bastaria para me levar ao tempo em que me mostraste o alcance das minhas mãos. O tempo deposita-me a memoria, semeia o dia que me percorro, inteira, sem reservas sobranceiras à verdade de mim. Um dia, uma hora, um instante. Estás em mim no despertar do meu dia.

1 comentário:

Jorge disse...

Milita,
Deixei-me embalar pelas deambulações nostálgicas deste magnífico e sentido poema, levitei...mas não me despeço. Voltarei...
Bjis
J