20 outubro 2009

Acaso com sentido

Vejo-me ao longe, ouço os meus passos na calçada branca fronteira ao mar. Ouço o vento que envolve o meu vestido em remoinho e o cheiro que me enebria de encontro ao poente. Sinto um nevoeiro ainda mais cinzento. Espicaça a minha arte de naufragar em sonho eleito.
Aspiro o frio que me ampara, abrigada num mural contado, de ardósia negra e ainda virgem. Nas minhas mãos, a leveza de cada história que um dia hei-de contar ao mundo inteiro, esperando que mais ninguém ouça. Pesa-me a memória que levo comigo.
Há uma musica de fundo, que eu conheço mas não sei cantar, por isso, acompanho em murmurios sortidos que entoo ao acaso. A Invernia anuncia-se em humidade que trespassa o meu próprio instinto. Vejo-me cada vez mais longe, contente, ausente deste tempo em que nada é somatório e convergente.
Volto a mim e vejo-me sorrir, aquele sorriso que me estremece, que se esboça sem jeito.
Percebo que em mim, se troca a presença pela magia. Sou o que quiser, por um momento, sou verdadeira. Enlouqueço em passadas tropegas e sem nexo, sigo de perto cada encanto que os meus olhos querem ver, idealizo-o, com todas as cores que existem, iluminado pela neblina aurea que nele se aclara.
Não o espero, não fui ali para o ver, Ele sabia.
Magia que sempre sonhei e nunca tive. Traz um ar de quem domina, por saber que eu não acredito. Traz um olhar por me ver, só por isso. Traz uma palavra que precisava de me dizer. E eu digo porque já a ouvia. Traz mais ainda, um sentido de vida, mais forte que o céu e a terra e todas as explicações e racionalizações estudadas. Traz vida, a minha.
A tarde cai de mansinho, sem se anunciar, sem pretender distrair um olhar. Eu, defronte a um mar espelhado de cinzento, envolta num abraço do mesmo tamanho, despedida de tantos passos até chegar.
Não sei explicar. Sinto. Descobri que é assim o meu sonho, não importa o que digam. É só assim que caminho, em todos os sentidos que a minha loucura me indica, é nele que guardo cada naufragio, cada conquista, cada erro e passo. É nele que se encerra o meu medo e a minha descoberta.
Sei mais que isso, mas agora, não importa.


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