14 outubro 2009

Faço-me falta

Cheguei a casa trazida por um vento quente que se sublima na minha cara. Veredicto transformado em neblina. A minha cabeça é o indicador do meu reflexo interior. Encontrei o meu abraço nos livros que mantenho em cada  passo do meu dia. Servem-me para não pensar, pensando no que preciso saber.
Ilha numa sala demasiadamente branca onde se vulgarizam vivências que não partilho, sinto-me envolta em mim e no que me permito apreender. É exiguo o meu mundo, face ao desprendimento do meu sentir. Deixei-o livre por fraqueza, por grandeza que não encontro, mas sei existir em mim.
Sinto-me estranha, cada vez mais distante.
Do silencio, fiz uma arte em que me desenho. A voz é mais audível não falada, se digo, não me ouço.
Encontrei-me defronte de um senhor idoso de bata branca, em poucos minutos, disse-me que a matéria era outra, inorgânica, do foro emocional. Ensinou-me exercícios e deixou-me chorar. Disse-me que precisava de falar. Disse-lhe que não. Que falava demais sem conseguir dizer o que sinto. Que se chorasse, era mais sincera. Chorei então.
A minha cabeça doi em proporção.  Todos os meus gestos são negação, oposição. Saudade sem expressão, um vazio feito de mim e da minha falta.
Sinto-me cada vez mais a caminhar de encontro a algo que me ultrapassa, imagens bailam em mim, arrastando-me para rituais desconhecidos, parecidos com os que já não julgava existirem. Elementos antagónicos alternam-se, loucura embebida de uma lucidez lancinante.
Hoje, o meu sitio na serra, acolheu-me como sempre. Sereno, iluminado. As ultimas palavras devolviam-me uma calma que já não me lembro. "Você faz falta...". Efemeras palavras que me induzo em jeito de convicção. Faço-me falta!
Retrocedo em cada momento que me esqueço de não me pensar. As contas ajustam-me a dormencia do meu entendimento. O meu vazio é tão grande....
Talham-me os olhos inquisidores, não os vejo, colho uma flor sem cheiro, aspiro, sem respirar, ando sem caminhar. Tropeço em mim mesma em cada passo, enquanto a minha alma vagueia em mim, solta, sem perdão, ilustra espaços, imagens, um olhar que me cegou de tanto me saber.
O meu despertar foi esta noite quente em que me vendo, não vejo.


2 comentários:

Sonhadoremfulltime disse...

Amiga,
agradeço os comentários que me acendem a chama da escrita.
Também eu muitas vezes caminho com passos errantes ao encontro de algo que me ultrapassa, e que vejo muito à frente e sou incapaz de agarrar aquilo que desejo de alma e coração.
Mas, escreve... porque fazes-nos falta.

Um abraço amigo

PAS[Ç]SOS disse...

As lágrimas podem ser a sinceridade que as palavras verdadeiras não conseguem. Sentimentos efémeros que se esgotam na sombra de palavras que nos fazem falta, e com as quais podemos construir ausências. Precisamos de nos preencher para que não nos sintamos em falta, para que não façamos falta. Precisamos de ser, para nos oferecermos. … em lágrimas …com palavras. Nossas!