12 agosto 2009

Certo ou errado

Quando era pequena e o mundo ainda tinha magia, lembro-me do meu pai me ensinar o significado de certo e errado, equivalente a ser bom e mau, criminoso e inocente. Reparei que era dificil explicar.
Para mim, era errado levantar-me da mesa antes do tempo e certo era pedir para o fazer. Os bons faziam coisas boas, tinham vozes e caras doces, e não falhavam, os meus pais, professores, os escritores e sabedores; os maus tinham cara disso, tinham bigode e voz fria, mãos grandes e passadas pesadas. Os maus eram-no porque queriam.
Eram certos os valores, errados os enganos. Não entendia.
Lembro-me também da primeira vez que dei um beijo na boca, do João. Não gostei, parecia errado, por isso, não disse a ninguém. Hoje acho que merecia ter saboreado, era o primeiro.
Era boazinha, aluna exemplar, disciplinada e bem comportada, mas eu calava tanto que sentia ser errado. Era como se o mundo me examinasse e avaliasse a cada passo e eu precisava de passar.
Minimizei o erro de não me mostrar. Chamei-lhe decisão.
Mais tarde, sem me entender, quis explicar a minha autodestruição, resolvi olhar de novo em volta e percebi os valores invertidos de quem me ensinara. A bondade era submssão e a aventura, evasão. Também não. Mas servia.
Houve sempre uma voz cá dentro que me foi falando baixinho para não olhar assim. O certo também é errado e os bons são maus. Chama-se humanidade.
Reconstrui-me de mala feita, pronta para apontar o horizonte, vazia de convicções mas castrada em ordenamentos, de vez em quando, via os meus trapos guardados e vibrava de memórias cheias de vida só sentida, a minha, a calada.
Fui prostituta de corpo e opinião, fui dama de companhia e menina de bem, fui criminosa e maltrapilha e endoideci longe de mim, estive tão certa e errada.
Hoje, calo-me, estou cada vez mais calada, com umas tantas rugas na cara, as minhas mãos desceram das ancas para se juntarem de embaraço. Certo ou errado?
Não sei, não quero saber.
Perceber fez-me perder.

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