19 setembro 2009

Divagação

Fui passear com o meu amigo. Corremos juntos. Fiquei cansada enquanto ele me chamava e desafiava. Ando cansada.
Enquanto caminhava e avistava o que consigo ver, em cada olhar de uma paisagem já conhecida, descubro sempre uma nova perspectiva.
Ontem, falava com um amigo sobre o engano das primeiras impressões. As minhas, são sempre erradas, e as segundas, pior ainda. Corro o risco de rejeitar, antes mesmo de me deixar conhecer. O aparentemente diferente, torna-se sempre banal e o contrário também acontece.
Estou cansada de glamorizar algo em que nem eu acredito. O que de facto me atrai é o surpreendentemente real. Encanta-me a podridão tanto quanto a vivência ligeira de quem parece levitar. Como este olhar distante onde se enquadram tantas imagens diferentes e irreais, porém verdadeiras.

Pensei em traição. Uma palavra à qual atribui a capacidade de se multiplicar em inumeros adjectivos com que me presenteei. Quem trai, esconde, é omisso e falseia, quem trai alguém, engana. Uma mulher que trai, prostitui-se de alguma maneira. Conceito primeiro do meu olhar.

Por conceito, nas várias vertentes, traição é sempre uma "forma de decepção ou repudio de prévia suposição, é um rompimento de presunção de compromisso", ou ainda "é uma ruptura completa da decisão anteriormente tomada ou das normas presumidas pelas outros"
Depois há as explanações de sapientes psicoterapeutas acerca das causas fundamentadas para a traição. Neste caso, por experiencia própria, abstenho-me de divagar. Tenho sempre a sensação que o conhecimento empirico é mais verdadeiro. Mudei sempre de opiniões certeiras a partir do momento em que as vivi.

Já trai e fui traida. Significa que tive compromissos que rompi e que outros romperam.
O julgamento e a culpa estão inerentes, se se trai, engana-se e invade-se a integridade de três pessoas.
No Irão, uma mulher que trai, é morta à pedrada pelo marido, que antes disso, se senta com o amante numa combinação calculada acerca do preço da passagem de posse. O amante nunca paga e a mulher morre.
No japão, a traição é fomentada. A esposa, alicia o marido a trai-la na esperança de encontrar harmonia no casal. A ajuda de terceiros é bem vinda quando se trata de colmatar "necessidades".
Os Latinos são ainda menos nobres, encaram a traição como ferida de honra e orgulho masculo. A verdadeira mulher que se tem em casa, é imaculada, intocavel, uma cabra, se olhar em volta, mas os homens não, a masculinidade impele-os a propagarem o seu semen precioso em todas as direcções. Fica-lhes bem. Há dois tipos de mulher, a que se tem e a outra e valha-nos Deus se a desgraçada se compara.
Até Moisés admitia a poligamia masculina.

Ouvi alguém contar-me uma vez uma história acerca de um palerma qualquer que deixara alguma marca ao dizer que cada vez que traia a mulher, certificava-se que era com ela que gostava de fazer amor.

Mas trair, não implica decepção?
Trair não é o culminar de um grito de silencio continuado que não se faz ouvir?
E quando simplesmente se desperta para a suposição viciada em que não se acredita? E quando as mesmas imagens, de repente se visitam com outro olhar? E quando os sentidos nos dançam em bailados em que finalmente nos reconhecemos e julgavamos serem apenas sonhos?

Traição é negarmo-nos a nós próprios? Ou descobrirmo-nos?
Traição é a restea do grito ou o despertar dos sentidos?
Traição é o que fiz a mim mesma toda a minha vida, negar o compromisso comigo mesma, espartilhar-me em suposições castrando o meu direito a sonhar.
Traição é a minha própria desilusão.

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