13 setembro 2009

Sei

Chove lá fora, gotas de agua que se espraiam em terra quente, escorrem vaporizadas por uma rua abaixo, escura, estranha.
Sentadas à janela aberta, lembramos as noites quentes em que as horas passavam, entodas em sopros de cansaço e prazer de vida. Tez morena e clara, vidas caladas e consentidas, amigas. Nunca nos contamos a verdadeira história, mas ambas sabemos, pelo olhar, que as convicções disfarçadas na terceira pessoa, são paixões vividas e escondidas, não por vergonha, mas pela alegria de nos presentearmos com uma nova verdade que fomos construindo.
De vez em quando dissemos "Eu sei", ou assentimos no silencio, o entendimento.


Lembro de vê-la chorar sozinha, vestida de preto, naquele banco de cimento que enchia o espaço de um cigarro até à exaustão, foi assim que nos conhecemos.
Nessa noite, num bar do Bairro Alto, gozando o silencio da musica nos ouvidos libertos de mais um dia, encontramos sintonia, concordavamos e despertavamos admiração em opiniões vividas e generalizadas.
Só me contou mais tarde. Admirei-a tanto por não entender.E
Entendo agora e ela, calada segue dizendo com calma "Eu sei".


Ela sabia, sabia há muito tempo e nunca me disse nada. Sabia que eu não era feliz, mesmo distante, a minha voz entoava a antitese do que ela via. Falava-lhe de estranhos que ela já conhecia, contava-lhe surpresas gritando armadilhas e ela dizia que sabia.

Um dia, telefonei-lhe a chorar.

Acabei a rir-me, a lembrar-me das noites cumplices que só nos despertavam com o raiar do dia, das horas de trabalho adormecido que nos enaltecia. Só lhe contei mais tarde.

Pedi-lhe desculpa, agora entendia. Admirava-me eu, na cegueira da minha vida.

 
Erguidas, dos destroços arcaicos que nos devolvem à vida. Sentadas, fumando cigarros e aspirando o raiar de mais um dia, falamos, nada que não saibamos..



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